Sítio arqueológico em Jangada revela vida humana datada em 27 mil anos e figura na lista dos mais importantes da América
Vanessa Moreno
Em meio a Serra das Araras, no município de Jangada, distante 74 km de Cuiabá, um paredão de calcário inclinado serviu de abrigo para civilizações milenares. Cada camada da rocha revela um período do tempo. Quanto mais se escava, mais se descobre sobre a adaptação da humanidade, sobre práticas, valores e saberes de um povo.
Santa Elina evidencia a chegada do homem na América do Sul. Todos os vestígios encontrados ali atraíram pesquisadores do mundo todo, bem como uma missão arqueológica franco-brasileira, que realizou pesquisas durante 20 anos e descobriu que, há 27 mil anos, já havia civilização humana no local. Sendo assim, o sítio passou a ser considerado o segundo mais importante do Brasil e o terceiro da América.
“Santa Elina não é um patrimônio de Jangada, de Mato Grosso ou do Brasil. Santa Elina é um patrimônio da humanidade. O mundo volta os olhos para as pesquisas científicas feitas em Santa Elina”, disse Valdizar Andrade, presidente da Instância de Governança Regional (IGR) Circuito das Águas e entusiasta da valorização do patrimônio histórico-cultural.
Mais de 25 mil artefatos, entre sandálias, vestígios de carvões, madeiras, fibras e, claro, as mais de mil pinturas rupestres avermelhadas, de variadas formas, retratando pessoas e animais, comprovam a existência humana no local. Há estimativa de que os desenhos foram produzidos há 2 mil ou 2.500 anos.
Para além dos objetos e artes rupestres, foram encontrados também mais de 800 fósseis de animais extintos, dentre eles, uma preguiça-gigante, de cerca de 5 metros, extinta há 10 mil anos. Adornos produzidos com os ossos desses animais, revelam a prática da caça naquele tempo.
Já a flora indica uma utilização dos recursos da floresta semelhante a atual. Estudos constataram que os antigos usavam plantas medicinais, repelentes e amuletos contra cobras.
Os paredões de calcário continuam testemunhando fatos e, se preservados, permanecerão para a posteridade. Do tempo pleistoceno ao holoceno, da mais antiga e mais profunda história do homem pré-histórico, há uma série de vestígios de sucessivas ocupações do local, que ainda precisam e merecem ser estudadas e aproveitadas por toda a população.
“Santa Elina ainda não é um produto turístico, falta muita coisa para formatar, mas precisamos mostrar para o mundo como Mato Grosso é rico”, ressaltou Luis Carlos Nigro, presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Mato Grosso (SHRBS-MT) e do Conselho Empresarial de Turismo e Hospitalidade (Cetur) da Fecomércio-MT. Para Luis, o sítio arqueológico precisa do desenvolvimento de estratégias de valorização e estruturação do local para que ele possa se tornar um dos destinos turísticos mais importantes do estado.
A título de exemplo, o Parque Nacional Serra da Capivara, maior sítio arqueológico do Brasil, localizado no Piauí, é uma fonte inesgotável de renda para as comunidades locais, pois é usado para estudos, para o turismo e, através dele, são produzidos diversos produtos para a comercialização, tais como: camisetas, canecas, pratos e outros, todos estampados com os desenhos rupestres encontrados lá. Tudo isso mantendo o sítio sempre protegido e íntegro.
Santa Elina foi tombada pelo Estado, em 2011, como patrimônio histórico-cultural de Mato Grosso, mas ainda não foi contemplada com um plano de manejo, nem um projeto de estruturação para o turismo. Para essa ideia avançar, faz-se necessário estabelecer áreas de preservação no entorno, construir passarelas e trilhas no local e incentivar os pesquisadores para que possam dar continuidade nos estudos.
“Eu tenho certeza que Santa Elina vai gerar muito emprego, renda, vai gerar desenvolvimento para o nosso município e para a nossa região se nós conseguirmos fazer aquilo que está em pauta: o plano de manejo e liberar Santa Elina para o processo de desenvolvimento da atividade turística”, anseia Valdizar.
Outro desafio é levar às escolas e à população um conhecimento que vai além da história mais recente de Mato Grosso, como sugere a guia regional de Turismo, Odailza Cristine. “Coloque isso também para conhecimento da comunidade e das escolas, porque você vai à praia, uma criança de sete ou oito anos guia você em qualquer ponto. Em Mato Grosso, se você vai em uma escola e pergunta uma coisa do centro histórico de Cuiabá, ele passa ali todo dia, mas ele não conhece aquela igreja, não sabe a história daquela praça, daquela feira. Então, se o objetivo aqui é transformar em um atrativo, que seja um atrativo completo e se alguém chegar e pedir uma informação, que a população, os moradores saibam”.
Visita Técnica
A fim de acelerar o processo de reconhecimento do sítio arqueológico Santa Elina como um patrimônio e atrativo turístico, representantes do setor turístico realizaram uma visita técnica no local no último dia 14, com o objetivo de demonstrar às autoridades públicas e à população as potencialidades do local, bem como dar o pontapé inicial em um projeto de estruturação.
Os participantes da visita trocaram ideias, demonstraram disposição para concretizar este projeto e demonstraram grande entusiasmo em relação à ideia de tornar o sítio acessível. “É a primeira vez que eu tenho acesso a um sítio arqueológico de pintura rupestre dessa natureza. Fico muito emocionada e grata a todos que me proporcionaram essa experiência”, agradeceu Adriana Reis, guia de turismo.
O prefeito de Jangada, Rogério Meira, também esteve presente na visita e demonstrou total interesse em ver este projeto sendo desenvolvido. “Estamos buscando parcerias para estruturar o turismo e alavancar esse grande potencial.” Isso vai ser muito importante não só para Jangada, mas para Mato Grosso e para o Brasil”, destacou.
Estiveram presentes na visitação membros da Prefeitura de Jangada, representantes de entidades ligadas ao turismo como Sesc, Senac, Fecomércio, além de representantes do Sindicato de Guias de Turismo, Sindicato de Apoio ao Transporte Aéreo Regional, Sindicato de Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares, e imprensa.